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Ele, o microfone e a mamã

"Radicalismos" de uma mãe galinha, rabiscos e cantorias do pequeno príncipe T e vida, muita vida para vos mostrar. No nosso T3 vivemos e sorrimos muito.

Ele, o microfone e a mamã

A Telescola do nosso Futuro

Liliana Silva, 20.04.20

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20.04.2020

Data para registar e marcar no tempo. Neste dia, pelas 09:00h dava início na RTP Memória (canal 100 da MEO) as aulas de ensino à distância para todos os alunos do 1º ciclo até ao 9º ano.

Hoje Tiago, registo este momento, para que mais tarde possas perceber um pouco da dimensão que tudo isto tomou na nossa vida e na vida de todos. Ouvi falar da telescola pelos meus pais, com a ideia de que o quadradinho mágico da TV chegava a casa dos mais pobres e das aldeias mais distantes por impossibilidades económicas e de deslocação.

Hoje a escola a que assistes pela televisão chega até ti por causa de um vírus que ameaça a espécie humana a cada canto do mundo.

Se me perguntassem há cerca de meio ano atrás se isto seria possível...? Definitivamente não!!!

Nunca, no meu perfeito juízo achava que ias tu, filho meu e outros tantos passar por esta situação, desta forma e neste contexto.

Hoje foi o dia do início!! Daquilo a que estamos habituados ser tudo diferente. Hoje a secretária estava em frente à televisão, estavas sozinho no meio da sala (não de aula mas da própria casa) e não podias conversar com os teus amigos nem fazer as perguntas à senhora professora Isa, que conheceste na mesma altura em que conhecias todo este novo método, até então arcaico e antigo.

Recebemos muitas mensagens (algumas de outras mamãs de amigos teus), o avô ligou ainda mal a aula estava a começar para saber se já estavas acordado e pronto, eu estava com o credo na boca e com o coração tão acelerado que quase saltava pela boca, afinal as novidades deixam-nos sempre com aquele suor frio na palma das mãos...e tu...bem tu não sabias ao que ias...mas lá foste tu...curiosidade na "venta" e animação no olhar, afinal a coisa era nova e estavas no quentinho da tua casa.

Dois módulos, uma professora, alguns apontamentos e para já nada de novo mas muitas histórias para ouvir.

Foi assim o teu primeiro dia de telescola, em pleno século XXI, com o vírus ao virar da esquina, com a incerteza dos dias a pairar no ar e com a certeza de que este 3º período do teu 2º ano vai com certeza ser um marco no teu percurso e uma história mais que terás para contar aos teus, lá mais à frente.

Opiniões de mãe?! SIMMMMM...muitasssss...que amanhã tentarei colocar por palavras. Hoje deixo apenas o parecer positivo do mini da casa, 7 anos de gente que aprovou a estratégia e que está pronto para os restantes dias (não sei se será com a mesma força como neste primeiro dia, porque as saudades dos amigos já apertam).

 

Um mês de Mim mesma e dos outros

Liliana Silva, 13.04.20

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Há precisamente um mês entrava na minha casa com um aperto no coração e uma grande interrogação na alma. Falava-se muito, ouvia-se ainda mais, as notícias tornaram-se pesadas e as ruas mais vazias. O silêncio ensurdecedor das estradas antevia um cenário para o qual não estava preparada. 

Nesse dia, almocei com o meu pai pela última vez, abracei-o já a medo e despedi-me com um "até já e não te esqueças que estou sempre aqui ainda que possa não estar presente fisicamente".

Nesse dia, sexta-feira, o Tiago andou nos baloiços da escola pela última vez até então, e disse aos amiguinhos que ia ficar tudo bem. Convictos que seriam apenas umas férias mais prolongadas, mas que passariam rápido e logo regressariam à rotina das corridas e das trapalhadas.

Nesse dia, falei presencialmente com os outros pais e concordámos todos que ia ser duro (mal nós sabíamos o que por aí vinha).

Nessa sexta-feira meti a chave na porta com a certeza que seria por muitos dias...dias aos quais ainda não me habituei.

Passaram 32 dias, onde me reiventei, me redescobri, me irritei, me odiei...onde já ri muito mas onde as lágrimas teimam em cair nos dias mais pesados. Passaram 32 dias e não pensei que me sentiria tão presa. Passaram 32 dias onde já fiz um pouco de tudo, onde invento mapas semanais para o miúdo, onde invento actividades físicas para não perder o foco, onde cozinho bolos e bolinhos para passar o tempo e trazer algum alento aos dias. Já arrumei gavetas perdidas, limpei janelas e postigos, fiz reciclagem de materiais e deitei fora muitas das coisas que guardava por medo de me perder na memória que deles tinha.

Passaram 32 dias... um mês a ouvir novos casos, mortes, confinamentos, isolamentos...e continuamos todos na incerteza de um futuro que neste momento está confinado às paredes da nossa casa.

E se nuns dias acho que estou rodeada pelas asas de um anjo, outros há que acho que o demónio incendeia as paredes deste meu T3 e querem saber...? Ou isto nos faz dar uma grande volta ou então de nada serviu para sermos melhores pessoas.

Quero acreditar que vai ficar tudo bem, mas sei que isso nunca será possível para todos e no mesmo pé de igualdade. Questiono-me muitas vezes se as pessoas terão realmente noção da dimensão da bolha em que estamos metidos...é que a mim parece-me que ela rebenta com tamanha facilidade que leva tudo e todos, sem escolher e sem olhar.

Passaram 32 dias... a 13 de Março entrei com o meu filho em casa e desde então tenho medo de tudo e de todos! Dizem que quando isto acabar vamos abraçar-nos ainda com mais força e com mais vontade, mas será? Será que depois de tudo isto vence o medo ou o Amor? 

Marco no calendário da minha memória este mês, estes dias inteiros e tão incompletos. Se antes estavamos prisioneiros do tempo e do relógio, neste momento, tempo é coisa que não nos falta e ainda assim continuamos a ter esta sensação de prisão. 

Que nestes cruzamentos da vida, sejamos capazes de encontrar em nós mesmos, coragem para continuar a caminhada que a vida nos destinou. 

E porque para encontrar-mos o arco-Íris precisamos passar pelas tempestades, EU ACREDITO 

(Ps. Pai, aguenta isso aí que ainda há muito caminho a percorrer)

Um pedaço de céu

Liliana Silva, 08.04.20

 

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Hoje escrevo como filha... Porque acho sempre que devemos descrever os sentimentos e deixar gravado aquilo que nos move sem medo de falar. 

Nunca teremos forma de aceitar a despedida de quem amamos. 

Por muito que nos preparem, não há maneira possível e eficaz para este processo. 

Digam o que disserem e doa o que doer queremos sempre mais tempo junto aos que nos querem bem e aqueles que nos deram vida. 

Hoje o mundo está parado para todos... Há 8 anos parou para mim quando perdi a pessoa mais importante da minha vida. Hoje o mundo pára para pensar e há 8 anos fui eu quem parei no tempo para saber o que ia ser de mim depois de ti. 

Ainda que falemos todos os dias, a todas as horas... Ainda que tenhamos os nossos encontros fortuitos num qualquer sonho perdido de mim... Ainda que eu saiba que o nosso amor é real, às vezes é difícil Mãe. E às vezes é mesmo bem difícil. Tu eras a minha âncora. Eras a minha balança acertada. Eras os ponteiros do relógio sempre certos. Contigo tinha a capacidade de ver os dois lados da moeda e conseguia a proeza de ouvir o meu coração, coisa rara nas pessoas por estes dias. 

Faltou-me TUDO num momento em que tinha TUDO para sermos felizes! E ainda que eu tente arranjar uma calma dentro de mim, não posso enganar-me sabendo que será sempre uma calma aparente.

O mundo hoje está parado Mãe... Tal como me senti há 8anos atrás. E tal como te deixei partir dentro da paz que dispunha, hoje peço - te essa mesma paz para enfrentar o que vem por aí. Peço - te que me guies mas sobretudo peço-te que não O deixes sentir-se sozinho nesta batalha... Sim ele...

Tens nova tarefa Mãe!! Arregaça as mangas e continua por aqui. Ocupa a tua casa, aquela para onde olho todos os dias e manda daí as boas energias que tão bem tu sabias fazer.

Nesse pedaço de céu eu acredito que farás milagres... Como continuas a fazer todos os dias quando me avisas que a vida é para ser vivida e que os obstáculos são para ultrapassar e seguir em frente. 

Não fosse um Amor assim e nada tinha neste mundo❤️